segunda-feira, abril 17, 2006

Não leve o rock tão a sério

Essa história começou na virada dos anos 70/80, com a sempre exagerada imprensa musical inglesa, e não demorou a se refletir no Brasil.
É o vício de levar o rock a sério. De apresentar gente como Ian Curtis (do Joy Division), ou Morrissey (dos Smiths) como salvadores e porta-vozes de uma geração. De chamar a vocalista Elizabeth Fraser (dos Cocteau Twins) de "a voz de Deus". De passar uma vida inteira discutindo mensagens subliminares em letras do Led Zeppelin. De venerar guitarristas, escarafunchar versos de meras canções populares em busca de um significado maior.
Minha geração de jornalistas musicais tem responsabilidade sobre isso. Com avidez pelo novo, mas muito menos bagagem intelectual e musical do que nossos equivalentes gringos, adotamos uma versão rasa do estilo da imprensa londrina.
A crítica ficou reduzida a um jogo de palavras. À busca de algo que soe bem e falseie erudição -retórica vazia. Desculpe a pieguice, mas sinto culpa ao ver algum jornalista mais jovem formular teorias sobre uma nova banda de moleques ingleses que nunca devem ter lido mais do que cinco livros e cuja coleção de discos resume-se aos três dos Strokes e algo dos Ramones.
Agora, por exemplo, há o deslumbramento com os Arctic Monkeys, da Inglaterra. "As letras citam Shakespeare", comenta-se no mundo todo. Ora, na Inglaterra, aprende-se Shakespeare desde o ensino fundamental... Inegável que as letras dos Arctic Monkeys ficam muito acima da médica roqueira, mas daí a elevá-las ao status de grande poesia...
Letra de música -rock, samba ou o que for- não é literatura. É claro que existe Morrissey, culto, com suas letras recheadas de citações literárias. É claro que existe Chico Buarque, com a sofisticação de suas métricas incomuns e aliterações. Mas são só compositores populares.
Não vieram salvar ninguém.

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