terça-feira, fevereiro 27, 2007

Três dias de seriedade

Terça, 27 de fevereiro de 2007, 09h39
Cláudio Lembo


EFE


Com o início do ano brasileiro, depois que termina o Carnaval, vai-se embora a seriedade
É paradoxal, mas o período de seriedade terminou. Uma vez findo o Carnaval, começa o ano brasileiro. E a seriedade se vai. Cai-se no cotidiano e este é marcado pela ausência de limites. Vale tudo.

Todos os veículos de comunicação, no período de Carnaval, cobrem os acontecimentos com grande acuidade. Só especialistas são chamados a se pronunciar sobre os desfiles de escolas de samba, blocos, enredos, trios elétricos e demonstrações de maracatu. Não vale penetra.

Agora, porém, quando o ano se inicia, todos os fora-de-estrada comparecem. Falam sobre o que sabem e muito mais sobre o que desconhecem. Somos o país dos catedráticos, figura sempre no imaginário nacional.

Vai ser assim, daqui por diante. Até que chegue novo Carnaval e com ele o retorno da seriedade. Só resta, pois, a partir de agora, rir perante o grande circo que se instala.

Há os que entram no picadeiro com a sisudez própria das índoles autoritárias. Outros mantém traços dos dias que se passaram. Estão sempre sorrindo e adiando decisões. Entre uns e outros, são preferíveis os que mantêm o sorriso.

Nada mais chato que a pessoa que se leva a sério.

Já que chegamos aos tempos normais, é importante analisar assuntos que ficaram submersos durante o tríduo governado por Momo, um rei de bom senso.

A reforma política é um deles. Encontra-se em curso no Senado Federal uma emenda constitucional que restabelece a cláusula de barreira, aquela que impede os partidos de frágil densidade eleitoral de manter privilégios.

Deve ser aprovada no Senado, mas na Câmara dos Deputados as coisas são diferentes. Nesta Casa, os parlamentares sabem ser bom contar com múltiplas legendas para eventuais excursões predatórias. Se aqui não dá, lá é possível que o cocho seja mais farto.

Há mais ainda. Caso aprovada a emenda constitucional, existe um risco. Ela ser julgada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. É bom lembrar o julgamento de ação direta de inconstitucionalidade que deu por contrária à Constituição lei ordinária que limitou os direitos dos pequenos partidos no cenário político.

A partir do mesmo argumento, uma emenda constitucional pode ser julgada contra os princípios que formam o sistema constitucional e, entre estes, se encontra implícito o direito das minorias de estar presente no jogo parlamentar.

Aí teremos uma novidade no cenário jurisprudencial brasileiro. Uma norma constitucional ser julgada inconstitucional porque contrária ao conjunto de valores constantes de nossa Constituição.

Vale a pena acompanhar esta situação. É repleta de facetas. Permite, com o retorno do tema, recordar um dilema permanente na nossa sociedade. Salvam-se os pequenos partidos, a partir de fundamentos nobres, mas repudia-se a busca da eficiência. Esta não é valor nacional.

Fiquem os pequenos partidos nos parlamentos, na busca de se dar voz às minorias, e afasta-se a possibilidade de se conferir maior celeridade aos processos legislativos.

O tempo abaixo do Equador é insumo irrelevante. Perde-se muito tempo e assim preenche-se os espaços vazios das vidas de cada um dos nossos parlamentares.

Não há motivos de preocupação. É assim a forma de viver dos latinos, particularmente quando se instalam nos trópicos. Ainda há pouco, o ministro das Relações Exteriores da República italiana, ao cair o gabinete, proclamou de maneira grandiloqüente: "Somos um país de loucos..."

A frase do ministro D'Alema causa preocupação. Acabamos de perder a hegemonia. Temos companheiros em nossa insanidade. Até boa companhia. Repleta de criatividade, mas de baixa eficiência.

O Carnaval das cidades brasileiras, assim como das italianas, é coisa séria. O resto é o resto. Tolices de um mundo globalizado onde a eficiência aniquila a alegria de viver.

Cláudio Lembo é advogado, professor universitário, foi vice-governador do Estado de São Paulo entre 2003 e março de 2006, quando assumiu como governador.

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Lei desobriga carteirinha da OMB em São Paulo

22.02.07 17:30

Até os modelos atuais das carteirinhas podem ficar na gaveta.

Lei desobriga carteirinha da OMB em São Paulo

O governador José Serra promulgou recentemente a lei 12.547, originada do projeto de lei 1.302/03 de autoria do deputado Turco Loco do PSDB, que "Dispõe sobre a dispensa de apresentação da carteira da Ordem dos Músicos do Brasil, na participação de músicos em shows e espetáculos afins que se realizem no Estado de São Paulo."

Em depoimento publicado no site da Assembléia Legislativa, o deputado afirma que seu objetivo com o projeto era o de proporcionar aos músicos a possibilidade de exercerem sua atividade sem constrangimentos: "Não são raras as denúncias que nos chegam relatando o cerceamento desses profissionais de participarem de shows para os quais foram contratados, por não apresentar a carteira da Ordem dos Músicos do Brasil ou não tê-la disponível na ocasião."

Criada em 1960, com a função de defender os interesses da categoria e fiscalizar o exercício da profissão, a OMB têm sido alvo frequente de críticas da própria classe que alega proteger. Além da falta de transparência nas eleições e balanços, reclamações de muitos músicos afirmam que a obrigatoriedade da carteirinha serve somente para engordar os caixas da organização.

Em resposta à pressão para a extinção ou reformulação da OMB, o advogado Bruno Ramos criou recentemente a Associação dos Artistas da Música que tem como objetivo fiscalizar as ações da organização. Em comentário sobre a nova lei, entretanto, a associação lembra que é competência da União legislar sobre as condições para o exercício de profissões, sendo então a referida lei inconstitucional.

A nós resta somente torcer para que a afirmação do deputado Turco Loco se realize e que este seja apenas um primeiro passo para a desobrigação do uso da carteirinha da OMB em território nacional.

Tetê Tavares

Groove Armada com novo álbum

Soundboy Rock chega em maio e a expectativa é grande.
26.02.07 12:30

A dupla britânica - e dinâmica - formada por Andy Cato (Andrew Cocup) e Tom Findlay está nos "finalmentes" do Soundboy Rock, novo álbum que deve chegar às lojas em maio.

A expectativa é grande, já que a dupla não lança um trabalho com músicas inéditas há quatro anos.

Soundboy Rock sucede Love Box, de 2002, que contou com participações de Sunshine Anderson e Neneh Cherry. Em 2004, os mocinhos lançaram uma coletânea reunindo suas melhores produções, incluindo os hits "My Friend", "Superstylin" e "See You Baby", remixada por Fatboy Slim.

Recentemente, Andy Cato se apresentou sozinho no Brasil, agitando as noite de Carnaval Eletrônico no Sirena, em Maresias (SP), e em Búzios (RJ). O Groove Armada passou por aqui em 2002, promovendo Love Box, e no ano passado foi um dos destaques da Creamfields Brasil, que aconteceu em novembro, em Curitiba.

Para os mais apressadinhos, a faixa "Get Down", a música de trabalho do álbum, já está disponível na página do My Space do duo londrino.

Confira a tracklist de Soundboy Rock:

01. Hasta Luego Mr. Fab
02. Get Down
03. The Things We Could Share
04. Save Our Soul
05. What's Your Version?
06. Paris
07. Love Sweet Sound
08. The Girls Say
09. Lightsonic
10. Soundboy Rock
11. Drop That Thing
12. Song 4 Mutya (Out Of Control)
13. From The Rooftops
14. See What You Get
15. What's Your Version?

Greta Rincon

Jared, o emo

O ator de "Réquiem para um Sonho" pinta os olhos de preto quando canta na 30 Seconds to Mars

DA REPORTAGEM LOCAL

Jared Leto, em sua banda 30 Seconds to Mars, tenta imitar o vocal gritado e a aparência deprimida de Kurt Cobain, do Nirvana, mas, para isso, usa maquiagem nos olhos assim como os emos.
No seu segundo disco, "A Beautiful Lie" (de 2005, chega agora ao Brasil), o ator de "Réquiem para um Sonho" faz um som que lembra o encontro improvável de bandas como U2, Alice in Chains e Linkin Park.
Atores, você sabe, vivem de interpretar papéis. Isso gera uma questão: dá para acreditar na honestidade de um cara que sempre veste "máscaras" diferentes? Rock and roll depende de credibilidade. Quem ouve quer que uma banda toque com verdadeiro amor às guitarras.
E a rebeldia de butique que Jared mostra é mais gritante do que seu vocal, em letras que falam principalmente de como é difícil viver. Mas difícil mesmo é engolir essa temática, principalmente porque o discurso depressivo sai da boca de um galã bem-sucedido de Hollywood.
Você pode até perguntar: só porque ele é ator famoso não pode ter banda? Sim, é claro, mas sabe-se também que grupos de astros do cinema, como o Rock City Angels, de Johnny Depp, e o Dogstar, de Keanu Reeves, eram só passatempo.
E essas bandas logo caíram no esquecimento, não desenvolveram carreiras sólidas e não agregaram fãs. E a de Jared promete seguir essa mesma direção.(LEANDRO FORTINO)

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Acordo sigiloso vai permitir enterro de James Brown

da Efe, em Washington

Os filhos de James Brown e sua última companheira e mãe de seu filho mais novo, Tomi Rae Hynie, chegaram nesta quarta-feira a um acordo judicial que pode pôr fim à disputa sobre a herança do artista e, sobretudo, permitir o enterro do pai do soul.

James Brown morreu aos 73 anos, no dia 25 de dezembro, e está há quase dois meses embalsamado, à espera de que seus herdeiros cheguem a um acordo sobre seu enterro.

Eugene Hoshiko/AP
James Brown morreu aos 73 anos
James Brown morreu aos 73 anos
Segundo informações divulgadas hoje após uma audiência judicial realizada em Colúmbia, Carolina do Sul, os seis filhos mais velhos do cantor e a que se sente sua viúva, Hynie, chegaram a um consenso em torno do sepultamento do cantor "nos próximos dias", embora ainda não se saiba em que lugar.

A localização exata é "confidencial", disse à imprensa local o diretor da casa funerária de Augusta, na Geórgia, Charles Reid, que dirigiu o funeral de Brown e que tem sob custódia, em um lugar não revelado, o cadáver do cantor.

Reid, que diz que periodicamente abre o caixão dourado para confirmar se Brown continua nele, está à espera de instruções específicas. "Vou, abro o féretro e o fecho. [Ele] Está bem", disse

Divulgação
Funeral de James Brown, que morreu no dia 25 de dezembro do ano passado
Funeral de James Brown, que morreu no dia 25 de dezembro do ano passado
Os parentes de ambas as partes --os filhos e a que se diz sua viúva-- chegaram a um acordo com o juiz da Carolina do Sul para que um administrador especial supervisione a divisão da milionária herança do cantor. Os detalhes do que foi acordado são desconhecidos.

Os bens do inigualável intérprete de "I Feel Good" e "Get Up (Sex Machine)" estão em disputa, já que Tomi Rae Hynie, a última companheira sentimental de Brown e mãe do mais novo de seus filhos --que tem 5 anos-- apresentou um requerimento judicial pedindo metade da herança de seu marido, a que os filhos mais velhos do cantor se opõem.

Hynie, que tem 36 anos e é uma antiga backing-vocal do músico, era dependente de analgésicos e, quando Brown morreu, estava numa clínica de reabilitação. Os filhos mais velhos de Brown não reconhecem Hynie como mulher de seu pai e até duvidam que seu filho, James Jr., também seja filho do músico, como ela assegura.

Brown e Hynie se casaram em 2001, mas nessa época a backing-vocal ainda estava legalmente casada com outro homem, do qual posteriormente se divorciou.

Hynie e Brown nunca chegaram a formalizar sua união, por isso, na realidade, não eram casados.

quarta-feira, fevereiro 21, 2007

Adolescente indonésio pode ser condenado a sete anos de prisão

Jacarta, 21 fev (EFE).- Um menino de 13 anos compareceu a um tribunal do Norte de Sumatra para responder à acusação de roubo de uma barra de folha-de-flandres, e poderá receber uma pena de sete anos de prisão, informa hoje a imprensa local.

As organizações de defesa da infância denunciaram a violação dos direitos de Yaris, que está desde dezembro num centro de detenção para adultos.

A promotoria afirma que ele infringiu o artigo 363 do Código Penal ao cometer o suposto roubo, negado pela defesa.

O Centro para a Proteção e Análise da Infância solicitou ao juiz que ponha o menino em liberdade e anule as acusações.

Yaris já foi quatro vezes ao tribunal desde que foi detido, em 20 de dezembro. Desde então ele não tem ido à escola.

Em março de 2006, outro tribunal de Sumatra julgou um menino de oito anos.

nternet prepara-se para era da Web 3.0

Empresas e pesquisadores procuram sofisticar mais os mecanismos de busca para "adivinharem" desejo do usuário

Idéia já interessa a gigantes do setor como IBM e Google; empresa de aluguel de vídeo oferece US$ 1 milhão para quem melhorar seu sistema

SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON


Há algumas semanas, o Netflix, o serviço de aluguel de DVD por correio mais popular dos EUA, publicou um anúncio que chamava a atenção não só pelo valor envolvido, mas pelo desafio proposto. A empresa de Los Gatos, no Vale do Silício californiano, prometia dar US$ 1 milhão a quem desenvolver um método de busca mais eficiente do que o usado hoje.
Atualmente, o cliente que buscar no site da Netflix "Os Infiltrados", de Martin Scorsese, por exemplo, e decidir alugá-lo receberá a sugestão de levar também "Gangues de Nova York", "O Aviador", "Cassino" e "Os Bons Companheiros" (do mesmo diretor) e "The Good Shepherd" e "A Supremacia Bourne" (ambos com Matt Damon, ator de "Os Infiltrados").
A empresa considera que o atual mecanismo de busca é algo básico e primário. Propõe pagar mais de R$ 2,2 milhões a quem conseguir um algoritmo mais sofisticado. Quem procura "Os Infiltrados", violento longa policial indicado ao Oscar de domingo, pode se interessar por quais outros filmes? E se essa pessoa é um homem, de entre 30 e 40 anos, casado, morador de Washington (todos dados que a Netflix já possui)?
Mais: e se o cliente não dá a informação inicial ("Os Infiltrados"), mas descreve vagamente o que procura ("filme violento", "diretor consagrado", "baseado em Boston", "refilmagem de título oriental")?
O que empresas como a Netflix, mas também gigantes como a IBM e a Google, procuram é uma resposta a isso.
"A resposta", disse à Folha Nova Spivack, "é a Web 3.0". O termo, segundo o norte-americano, considerado o principal autor em semântica da rede, foi empregado pela primeira vez pelo jornalista John Markoff, num artigo do "New York Times" e logo incorporado e rejeitado com igual ardor pela comunidade virtual (leia a entrevista de Spivack abaixo).
Seria a terceira onda. A primeira, Web 1.0, foi a implantação e popularização da rede em si; a Web 2.0 é a que o mundo vive hoje, em que os mecanismos de busca como Google e os sites de colaboração do internauta, como Wikipedia e YouTube, dão as cartas. A Web 3.0 seria a organização e o uso de maneira mais inteligente de todo o conhecimento já disponível na Internet.
De que maneira? Daniel Gruhl, um dos diretores do Almaden IBM Research Center, exemplifica. Até agora, disse ele à Folha, a rede é como uma lista telefônica com bilhões de páginas. Um mecanismo de busca como o Google permite que o usuário pesquise o conteúdo de cada página -todos os Silva, para ficar na metáfora da lista- e mesmo utilize a "busca avançada" para restringir um pouco mais os resultados -todos os Silva de São Paulo.
"A Web 3.0 organiza e agrupa essas páginas, por temas, assuntos e interesses previamente expressos pelo internauta", afirma Gruhl- todos os Silva que torcem para o Corinthians, votaram no PSDB e são alérgicos a frutos-do-mar, digamos. Embora a tecnologia ainda esteja na fase de pesquisa, suas possibilidades comerciais são infinitas. E as empresas não estão cegas para isso.
Uma das provas é o próprio centro do qual Gruhl faz parte. Baseado em San José, também no Vale do Silício californiano, tem como função encontrar novos usos comerciais para a rede de computadores e prever quais serão as próximas tendências, os novos YouTube, por exemplo. Gruhl, um Ph.D. em engenharia eletrônica do MIT, é especializado em "compreensão das máquinas".
Tanto esse aspecto futurista das pesquisas quanto o próprio termo Web 3.0 são responsáveis pelo maior volume de crítica que a iniciativa recebe. A principal reação vem, obviamente, da blogosfera. Nos diários virtuais de especialistas detratores, a crítica mais comum é a de que "Web 3.0" nada mais é do que a tentativa de empacotar num termo "vendável" algo que ainda nem existe. "Eu aposto que o futuro é mais "inteligência humana" do que "inteligência artificial'", escreveu o expert Ross Mayfield.
Pesquisa divulgada no início da semana pela Weber Shandwick, uma unidade da Interpublic Group, uma das maiores empresas de publicidade e marketing do mundo, mostra que tais críticas não são unânimes. Segundo o levantamento, 86% dos 104 executivos das maiores empresas americanas ouvidos acreditam que a inovação trazida pela Web 3.0 será o setor que mais ganhará importância ao longo de 2007.
"O surgimento do consumidor com mais poder significa que as companhias não podem mais simplesmente falar de inovação como uma estratégia do futuro", disse Billee Howard, do planejamento da Weber Shandwick. "As empresas precisam procurar novas maneiras de implantar isso".

quarta-feira, fevereiro 14, 2007

Quem quer ser padre nos dias de hoje?

A Igreja Católica Apostólica Romana está ficando sem candidatos a padre. Quem quer ser padre nos dias de hoje e nesta era? Uma visita ao Seminário Saint Georgen, em Frankfurt

Annette Bruhns
Der Spiegel

Uma passagem escura conduz ao Seminário Saint Georgen, da Igreja Católica, uma estrutura arredondada de concreto exposto que poderia abrigar uma sala de cinema 3-D. O corredor é azul-marinho e se estreita à medida que se aproxima da igreja. No meio do caminho há uma pesada porta de vidro dotada de uma grande maçaneta, uma cruz de metal frio que precisa ser manipulada por todos que ali ingressam.

AFP
A Igreja Católica Apostólica Romana tem dificuldade e está ficando sem candidatos a padre


São pouco mais de 18h. Os devotos chegam para a missa da noite, uns poucos padres e freiras idosos, assim como a mulher pequenina que toca o órgão. A congregação é quase que inteiramente composta de seminaristas.
Os jovens candidatos ao sacerdócio passam pelo corredor em silêncio. No que diz respeito à aparência, eles são iguais aos rapazes leigos.

Os candidatos usam calças jeans baggy pretas ou cáqui e camisas pólo ou blusas de moletom, com ou sem logomarcas. Alguns têm o cabelo curtíssimo, outros trazem a franja à altura dos cílios. Correntes e anéis cintilam em alguns dos rapazes. Um deles usa uma pulseira de tecido verde. Vários trazem no rosto a marca da barba que, feita pela manhã, volta a crescer. E alguns exageraram na dose de colônia pós-barba. Um odor de Hugo Boss toma conta do corredor.

A porta da igreja se abre à esquerda, mas os homens fazem uma breve pausa antes de entrarem a fim de tocar a testa com a mão molhada em água-benta. Com uma ligeira inclinação em sinal de respeito em direção ao altar, cada um deles pega um hinário vermelho em uma pilha e senta-se em um dos assentos cinzas.

Essa igreja pequena e alongada foi construída para homens como esses. Homens que renunciam a uma vida mundana com o propósito de disseminar os Evangelhos. E que juraram levar uma vida celibatária -passada em completa abstinência sexual.

Pouquíssima gente acredita que tais pessoas ainda existam, mesmo na Igreja. Os católicos alemães estão enfrentando uma escassez de rapazes com vocação para o sacerdócio. Ser padre se tornou para eles a antítese do moderno.

Faz frio na igreja. A organista entoa a liturgia com uma voz clara como cristal. Um padre visitante da Polônia usando uma casula verde celebra a missa. Para os 16 novos seminaristas que vêm de toda a Alemanha, esta é apenas a segunda celebração do gênero aqui em Frankfurt. A homilia gira em torno de São Paulo, que escreveu à sua congregação: "Mas quando quis Deus, que me separou do útero da minha mãe e me chamou por meio da sua graça para revelar o seu Filho em mim, que eu pregasse a sua existência entre os gentios, eu não confabulei imediatamente com a carne e o sangue". Esses homens foram escolhidos? Como é que eles sabem quem lhes fez o "chamado"? Como sabem quais são as vozes que têm ouvido? No fim das contas, será que eles apenas têm problemas de ordem sexual?

Nesta manhã de outono, um cheiro de terra invade o quarto de Nils Schellhaas através da janela aberta do seu quarto. O Seminário Saint Georgen situa-se em um amplo parque ao sul do Rio Main. Além do seminário para os 37 aspirantes a padre, o complexo conta com uma comunidade jesuíta e uma Universidade de Filosofia e Teologia freqüentada por 430 alunos.

O homem de 24 anos de óculos de aros de chifre e que tem covinhas no queixo e na face é um ex-protestante que se converteu ao catolicismo. Quando Schellhaas dirigiu o seu carro até aqui no início de setembro, os seus sentimentos eram confusos. Será que o que o esperava era um nicho de homossexuais? Um clube gay disfarçado, possivelmente envolvendo pedófilos -tal como o Saint Pölten, na Áustria, onde um escândalo levou ao fechamento temporário do seminário?

Uma cela com uma pia

Atualmente faz quatro meses que ele está aqui. Ele tem calos nas mãos devido a todo o trabalho feito. Juntamente com os outros recém-chegados, Schellhaas espalhou cascalho em uma estrada e pintou uma casa de madeira. Juntos eles suaram e xingaram. E os seus temores desapareceram. "Embora nenhum deles pareça ter estado algum dia em um relacionamento, não há um só que dê a impressão de ser gay".

Schellhaas, um homem de expressão honesta e dono de uma voz alta e clara, deixou uma vida boa para trás. Estudante universitário, ele morava em um apartamento de dois quartos em Kiel, com uma vista para o Báltico - até recentemente, com a namorada. Ele sente saudade do espaço. A sua atual residência, "uma cela com uma pia", tem apenas 9,3 metros quadrados. Ele não sente saudade da namorada.

"Ela me abandonou porque eu estava dedicando tempo demais à minha fé e muito pouco tempo ao nosso relacionamento", explica o aluno de teologia. A separação mudou a sua vida. "Certa noite eu ia de bicicleta para casa e mal podia esperar para ver se me sentiria sozinho no apartamento sem ela". Quando abriu a porta, aconteceu um milagre. Ele se sentiu menos sozinho do que antes.

Schellhaas passa a mão pela barba rala e loura no queixo. "Ter uma parceira é algo que exige tempo e devoção. Sou uma pessoa que prospera na devoção a Deus, e se me dedico a uma namorada, fico sem tempo para receber esse amor de Deus". Vindo deste jovem devoto, tal raciocínio parece verossímil.

"Definitivamente sem celibato"

Schellhaas não herdou esse fervor religioso. Os seus pais deixaram a igreja. Esse rapaz do Estado de Hesse encontrou a primeira vez o Salvador quando, ainda garoto, viu crucifixos durante uma viagem à Itália. O garoto de sete anos observou fascinado as pessoas se ajoelhando diante das imagens de um homem pregado a uma cruz.
Mais tarde, as manhãs de domingo em casa se tornaram estressantes: ele queria assistir a programas religiosos na televisão, enquanto o irmão preferia desenhos animados. Schellhaas obteve a sua primeira bíblia em uma lixeira.

Na sétima série, ele ouviu o seu chamado. "Até então, eu queria ser jornalista, um repórter de televisão ou algo do gênero. Mas após uma discussão com os meus pais, essa idéia surgiu subitamente na minha cabeça: serei padre. À época, eu sequer sabia o significado disso".

Os seus pais - o pai de Schellhaas é vendedor de programas de computação - esperavam que o filho acabasse superando essa fase com a idade. Mas no segundo grau Schellhaas escolheu latim como língua estrangeira e começou a freqüentar a igreja. "Eles disseram que estava tudo bem, mas só se eu me tornasse protestante. Assim, a coisa soaria menos estranha para eles".

O protestantismo se revelou uma escolha conveniente. "Embora eu nunca tenha gostado do atos excessivamente intelectualizado e anti-ritualista da Igreja Luterana, naquela época eu definitivamente não queria levar uma vida celibatária."

Ele decidiu se tornar um pastor luterano de cultura católica. Já no seu primeiro semestre como estudante de teologia na Universidade de Frankfurt ele rezava todas as noites com os monges capuchinhos. Schellhaas mudou-se para a Universidade de Kiel para ficar perto da namorada.

A decisão de se converter veio no verão passado, em Erfurt. Schellhaas tinha ido ao monastério agostiniano para desfiar o rosário. Quando deixava a capela, ele percebeu a existência de um sinal na porta comemorando o dia em que Martinho Lutero entrara neste mesmo monastério: 17 de julho de 1505 - "500 anos atrás neste dia". Um sinal do céu: era hora de colocar um fim à farsa, hora de o rebelde da igreja dar meia-volta - e se dedicar ao catolicismo.

Assim que concluir a sua graduação em teologia, Schellhaas participará de um seminário em Hamburgo para o curso subsequente de um ano em práticas pastorais - e a seguir será ordenado diácono. Se tudo correr bem, após mais um ano ele será padre na Arquidiocese de Hamburgo.

Os pais de Schellhaas também parecem ter se tornado religiosos. Originalmente casados apenas no civil, eles agora renovaram os seus votos na igreja para celebrarem as bodas de prata. Durante a viagem subsequente da família à Itália, Schellhaas espiou secretamente a sua mãe acendendo uma vela em Assis, e o seu pai fazendo o sinal da cruz.

Faz mais de um ano que Schellhaas não beija uma mulher. Esse organista devoto diz: "Estou feliz por já ter tido namoradas. Caso contrário, talvez algum dia procurasse saber se alguém gostaria de ficar comigo".

Mas Schellhaas não jura que jamais voltará a se apaixonar - e ele não é o único. Aqui, todos dizem o mesmo, até mesmo o padre católico Stephan Kessler, de 47 anos, o reitor do Seminário Saint Georgen - um homem grande que usa uma uma camisa de flanela sem forma definida e que tem uma expressão facial que lembra Mr. Bean. O escritório de Kessler é espaçoso e confortável. Há ícones nas paredes e um aroma de café fresco e de biscoitos se espalha pelo ar. O reitor é famoso pelos seus biscoitos.

Kessler é um homem tagarela cuja linguagem é temperada por mais que latinismos. "É claro que os padres também se apaixonam", diz o jesuíta. "Essa foi a causa efficiens para diversos seminaristas para os quais eu mostrei a porta da rua - e que às vezes foram recebidos de volta de braços abertos".

Segundo Kessler, todos eles precisam aprender a "integrar" a sexualidade e as emoções com o modo de vida celibatário. Ele próprio também já se apaixonou, quando era um capelão com pouco mais de 30 anos. Atualmente o ex-objeto dos seus desejos secretos é uma mãe de três filhos. Kessler é amigo dela e do marido.

Resistindo à tentação

A abstinência é um sacrifício que uma pessoa faz a Deus, assim como Jesus Cristo morrendo na cruz para salvar a humanidade? O padre repele rapidamente tal idéia. "Ninguém vai muito longe com uma mentalidade de sacrifício. Este modo de vida não significa um sacrifício maior do que a interação responsável com um parceiro em um relacionamento. A pessoa casada às vezes também se apaixona, e ela precisa resistir à tentação."

Todos os alunos do Seminário Saint Georgen ouviram essa argumentação - de que o celibato não é mais difícil que a fidelidade conjugal. Kessler fala enquanto as mesas são limpas após a refeição comunitária. A sala de jantar é um local convidativo para as reuniões. Mais do que um mero refeitório, ela tem mais em comum com uma cafeteria de um albergue da juventude. Os estudantes em volta prestam atenção a cada palavra de Kessler. O padre diz como, recentemente, a sua fé na ressurreição o abandonou após 30 dias de um retiro em silêncio. Ele pensou: "O.k. É isso. É hora de procurar um novo emprego". Durante meses ele lutou com a sua consciência - e foi então que conheceu um monge que o ajudou a superar as dúvidas.

Um rapaz muito jovem e bonito se destaca no grupo. Um pouco antes ele estava reclamando de que os corredores longos e altos do seminário, nos quais cada passo ecoa, fazem com que sinta que está na Escola Hogwarts, de Harry Potter. Tendo Albus Dumbledore como reitor. Agora o rapaz está mais perto, os seus ombros inclinados para frente, os olhos verdes luminosos ardendo em concentração. Lapsos de fé, questões referentes ao celibato - esses são assuntos intrigantes!

Seria esse o caminho certo para alguém como ele, que sempre se enxergou como um "homem de família?". O rapaz de 20 anos veio de um ambiente protegido. Ele foi criado como católico e tem dois irmãos. Estudante talentoso, o rapaz decidiu se tornar professor de religião. Mas quando confessou ao pai, um carpinteiro, que o que realmente queria ser era padre, foi surpreendido pela resposta: "Sempre soube disso", disse o pai.

Todas as árvores no Seminário Saint Georgen têm placas com nomes em alemão e latim. Christian Fahl aguarda do lado de fora, entre carvalhos, freixos e faias. O rapaz de 28 anos está radiante. Na sua blusa de moletom branco há a inscrição "Champion". A pele de Fahl tem a mesma tonalidade da camisa, e não lhe confere uma aparência saudável. Mas todo o estudo deu resultado: o seminarista foi aprovado na prova de história da igreja com menção honrosa.

Sempre ser feliz

"Agora posso começar o meu quarto semestre", diz Fahl. "E ficarei muito feliz por isto!". O rapaz está exultante, com um sorriso de orelha a orelha. Ele tem sido feliz durante toda a vida. Fosse como membro do coral infantil, como estudante ou como caixa de banco. Fahl sempre foi feliz.

O trabalho com a juventude o atrai sobremaneira. "Me conscientizei da minha vocação porque muitos jovens me procuravam com questões", conta ele.

Mas talvez ele não tivesse outra escolha. Fahl foi presidente da classe na escola, porta-voz da juventude no conselho paroquial, diretor regional da Organização da Juventude Católica Hochtaunus. Ele integrou o comitê diocesano, o conselho editorial do jornal da paróquia, o comitê religioso Uma Palavra e o "Círculo da Casa Carismática".

Fahl ingressou no Seminário Saint Georgen sem ser seminarista. Após trabalhar cinco anos como caixa de banco, ele quis primeiro dar o próximo passo para testar o seu sentido de vocação. Além do mais, ele percebeu que, com o seu grau de comprometimento com a comunidade e a igreja, restava-lhe pouco tempo para uma namorada. "A contemplação era algo muito importante", diz Fahl apressadamente. Para ele a reza era a única forma de encontrar as respostas para as questões que importavam: "O que Deus quer? Onde reside o Espírito Santo?".

Fahl não precisa parar para pensar. Ele enumera as suas impressões de vida como se fossem contas em um colar que o conecta a Deus: começando pela sua avó, que - graças à intervenção divina - sobreviveu a uma febre enquanto dava a luz à mãe de Fahl durante um bombardeio aéreo, e tendo continuidade com os seus professores devotos da escola de segundo grau e o patrão no banco, que o apoiaram na sua escolha.

Pessoas como Fahl não se constituem em uma surpresa em um local como o Seminário Saint Georgen. A surpresa é o fato de Fahl não parecer ser a regra, mas a exceção. Por outro lado, todos aqui são uma exceção, cada um ao seu modo. O mais jovem seminarista tem 20 anos, o mais velho 42.

Alguns vieram diretamente da escola. Muitos já trabalharam - como enfermeiros geriátricos, advogados, biólogos. Eles têm histórias diferentes. Lares intactos e destroçados. Famílias cristãs e atéias. Alguns cresceram em mansões, outros em orfanatos.

Astronauta ou padre?

Ao contrário de Fahl, a maioria deles entende a surpresa de quem está de fora com a escolha de vida que fizeram. Talvez porque eles próprios ainda estejam surpresos.

Vejamos por exemplo Mathias Mütel, um seminarista de 23 anos de Blankanese, um elegante subúrbio de Hamburgo à beira-rio. Aos 14 anos, ele decidiu provar ao seu professor de religião que Deus não existia. Até então, o adolescente se definira sucessivamente como anarquista, marxista e niilista.

"Mas não foi fácil como eu achava que seria", diz o rapaz de ombros largos e expressão circunspecta. Os seus pais, ambos arquitetos, não gostaram quando ouviram que ele queria estudar teologia. "Em Hamburgo é melhor você dizer que quer ser astronauta do que padre".

Hendrik Klentze, 35, precisou fazer duas tentativas até se acostumar ao seminário. Da primeira vez, cinco anos atrás, ele nutria altas expectativas. Mas os seminaristas sempre estavam brigando, havia pelejas da mesma forma que em qualquer outro lugar. E como recém-convertido ao catolicismo, muita coisa era completamente incompreensível: por exemplo, as horas passadas rezando ante o hostiário. A rodela de pão sem fermento lhe lembrava o biscoito usado para fazer o Lebküchen alemão. "Eu não parava de pensar: 'Eles estão idolatrando um biscoito'".

Mas Klentze mostrou-se obstinado. Ele abandonara a carreira de arqueólogo e se separara da namorada. Os seus pais - o pai era ginecologista e a mãe psicoterapeuta - criaram-no segundo o espírito anti-autoritário de 1968, e acharam que ele estava maluco. Naquela época, Klentze se esquivou da questão indo estudar teologia em Münster. Agora ele sente-se pronto para o Seminário Saint Georgen.

O seminarista polonês Michal Swiatkowski está se preparando para ser padre em uma diocese alemã. O rapaz de 26 anos de olhos hipnóticos freqüentou anteriormente um seminário polonês. Ele permaneceu naquele seminário por dois anos antes de se tornar jornalista. Mas tarde arranjou também uma namorada. A falta de padres na Alemanha lhe permitiu retomar a rota sacerdotal aqui. "Há candidatos suficientes na Polônia. Não dá para tirar uma licença em meio aos estudos".

O candidato a padre acredita que o celibato seja importante, embora saiba que será algo difícil de praticar. A certeza de saber que venceu esse desafio poderá vir muito tarde, conforme um velho padre lhe revelou certa vez: no leito de morte.

"O vinil já era!"

Cinco perguntas para Dave Clarke
DJ/produtor lança coletânea de remixes e diz que o vinil morreu
13.02.07 18:45

Cinco perguntas para Dave Clarke
"Estou otimista e empolgado com relação ao futuro da música. Os dinossauros estão perdendo seu domínio, o DJ superstar está morrendo e tem uma porrada de música ótima por aí. E o MySpace permite que artista fale com artista sem barreiras."

O ícone do techno britânico, Dave Clarke, admite que começou o ano rejuvenescido por estar tirando suas primeiras férias longas em muitos e muitos anos. Mas ele confessa que o que realmente tem o estimulado é a constante transformação tanto da cena dos clubes quanto da indústria musical, com a digitalização sendo um assunto de especial interesse.

"O vinil está morto, não há futuro comercial sustentável para ele", ele afirma. "Haverá lançamentos em sete polegadas para a ocasional guitar band e o vinil continuará existindo em Berlim e na Alemanha por um tempo mas em todos os outros lugares ele já era."

Uma coletânea de remixes seus acaba de sair do forno: Dave Clarke Presents Remixes & Rarities (1992 - 2005). Inclui versões suas para faixas de Slam, Fischerspooner, Laurent Garnier, Gary Numan e Chemical Brothers, entre vários outros.

Quais são as implicações para o mundo dos DJs se o vinil desaparecer?

Se adapte e sobreviva é a mensagem evolutiva... isso pode ser aplicado à tecnologia. A maioria dos DJs que conheço já tem a muita música em CD então não vai ser o fim do mundo. Os perdedores serão os caras com a cabeça enfiada na areia. Nos últimos cinco anos venho trabalhando para implementar uma solução digital, passando toda minha música para esse formato. Também faz sentido ecologicamente. Tento ser o mais "verde" possível dentro do meu trabalho. Agora não preciso mais queimar toneladas desnecessárias de carbono carregando 30 quilos de vinil toda semana. O vinil é ecologicamente irresponsável, CDs são melhores e HDs são ainda melhores levando em conta peso e manufatura. Não há mais necessidade de discos serem transportados até a loja ou se serem entregues pelo carteiro. Quem ganha é o meio-ambiente e o DJ por ter que aprender novas habilidades

E sets feitos no laptop, com programas como Ableton Live, onde dá para encaixar as batidas perfeitamente e sem esforço. Que impacto esse processo está tendo no papel do DJ?

Sempre houve DJs sem habilidade, aqueles que levantam os braços depois que fingem equalizar algo ou colocam CDs mixados para não precisar tocar no pitch. Isto não mudará apesar da democratização da tecnologia musical. Alguns DJs falam todos felizes sobre o Ableton e alguns desses DJs não sabiam mixar antes e agora não precisam mais, mas eles são comerciais e não representam nada. Alguns outros DJs estão criando novas e empolgantes paisagens musicais sonoras. Minha escolha pessoal é o Serato porque permite mixagens precisas. Na minha visão, o Ableton é uma ferramenta de produção e não de DJ.

O quanto você se vê como uma marca? O quanto você tem que levar em conta o que o nome Dave Clarke representa?


Não me vejo nem um pouco como uma marca, mas outras pessoas vêem. O que eu represento é música inovadora e empolgante, do tipo que não toca na BBC, e toco isso para público que tem a mente aberta. Eu também tenho grande prazer em lancer artistas apenas pela sua música e não porque eles tem o mesmo empresário que eu.

Falando de álbuns de música eletrônica, parece que o gênero segue sendo dominado por singles com pouquíssimos títulos sobrevivendo ao teste do tempo, com exceção de nomes com Leftfield, Underworld, Orbital e The Prodigy. Por que tão poucos grandes álbuns aparecem?

Quase todos os álbuns de música eletrônica eram lixo, particularmente porque era uma maneira de muitos artistas honestos finalmente serem pagos por alguns grandes singles mas também porque era uma maneira de vários artistas desonestos terem seu álbum feito por produtores de talento (e que nem sempre levavam crédito). Álbuns foram feitos principalmente para artistas de rock mas mesmo agora todo o conceito de álbum está de saída porque a maioria das pessoas não tem capacidade de manter a atenção por um álbum inteiro. O que é uma pena, porque é assim que você aprende a amar as faixas menos óbvias.

Os downloads digitais estão transformando a indústria musical muito rapidamente. O futuro da música é gratuito?

Essa é difícil. Eu ainda gosto de comprar música apesar de que sei que boa parte do dinheiro nunca vai chegar no artista. Mas cada vez mais percebo que não posso encontrar essa música numa loja, mesmo que eu encomende, então eu compro online. Não acredito que música deveria ser gratuita, a não ser que o artista assim o queira. Música tem um valor. O artista mostrou dedicação e deveria ser recompensado. Se um pedreiro pirateia música será que ele acredita que seus serviços deveriam ser fornecidos de graça? Downloads gratuitos é por causa das gravadoras terem abusado da ganância por tanto tempo mas, ironicamente, é o artista que também sofre.

Jonty Skrufff

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

A era do álbum está chegando ao fim", diz DJ Spooky, que fez palestra na Feira Música Brasil no Recife

MARCELO SOARES
Enviado especial ao Recife


O produtor, DJ e escritor Paul D. Miller, autor do livro "Rhythm Science" e mais conhecido por DJ Spooky That Subliminal Kid, foi um dos palestrantes do evento Feira Música Brasil, que acontece em Recife.

Na sua conferência realizada na última quinta (8), Miller falou sobre troca de fragmentos de culturas entre diferentes cantos do mundo, anacronismo das leis de copyright e novas formas de transformar antigas expressões musicais por meio de colagens e efeitos. Ele nos concedeu entrevista por e-mail, pois teve que sair correndo para o aeroporto para mais um compromisso ao redor do mundo.

Miller confrontou a moral "bizarra e anacrônica" da lei de copyright norte-americana a partir da teoria do fluxo de informação --principalmente pela Internet. Para ele, a possibilidade de troca sem intuito comercial subverte a hegemonia do propriedade sobre a música.

"É praticamente impossível você conseguir controlar a sua obra hoje em dia --seja na questão da livre circulação como também no uso de elementos para se fazer uma nova música", argumentou Miller na conferência.

Para ele, até é possível que um autor de uma música consiga coibir o uso de samplers de sua obra em um novo remix de um DJ qualquer, principalmente se a colagem tiver um intuito comercial. "Mas nada impede que amigos DJs montem em casa uma nova música a partir de elementos de uma canção mais antiga, mostre aos seus amigos e façam intercâmbio entre eles, sem ter a finalidade do lucro", exemplifica.

Paul acredita que se gasta muito dinheiro nos EUA para se coibir este tipo de música. "A cultura do DJ tem a ver com intercâmbios culturais e colagens", diz. Ou seja, o que ele entende como criatividade, as leis de copyright taxam como crime.

Depois da palestra Miller respondeu a perguntas enviadas pelo UOL por email enquanto se preparava para deixar o país.

UOL - Você acredita que a tendência da música contemporânea será a colagem de diferentes estilos num futuro próximo?
DJ Spooky - Tudo que rodeia a música hoje em dia --software, hardware, sistemas de som etc.-- demonstra que a era do álbum está chegando ao final. A possibilidade de baixar música pela Internet, o iPod, a livre circulação de vídeos no You Tube, tudo isso evidencia como música e geografia, está subvertendo todas as normas comuns do século 20. E isso está acima da tendência da colagem. Isso significa que tudo que fazemos hoje em dia está conectado, de uma forma ou de outra, ao software.

UOL - Como você observa o impacto das novas tecnologias no meio musical? Eles tendem a ser aceitas ou recusadas pela maioria dos músicos?
DJ Spooky - As pessoas querem produzir com mais facilidade e rapidez --e a tecnologia veio também para reduzir custos. Músicos abraçam a tecnologia porque eles saem ganhando em criatividade. Meu livro aborda este tema: por que a criatividade é a linguagem que vem traduzindo e atravessando aspectos da modernidade.

UOL - Por que a atual lei norte-americana de direitos autorais está obsoleta?
DJ Spooky - Ela pune a criatividade. Acredito em pessoas que enxergam o sampler como algo que veio para pôr fim a esse tipo de mentalidade medíocre. Ou seja, a música mixada pode ser tão importante quanto a original se conservada a sua essência. Isso é muito importante. E existem diversos artistas ao redor do mundo que pensam como eu: DJ Drama, DJ Krush, Coldcut e todos os MCs de hip hop, incluindo a Nação Zumbi também.

UOL - Qual o conceito de videoscracht?
DJ Spooky - Vídeoscratch vai ser a forma de trabalhar ruídos e imagens semelhante ao que se faz com a música há alguns anos. Se você quer fazer "apenas música", vai querer ter acesso a todas as possibilidades: sons legais, imagens interessantes, contextos climáticos. Tudo isso pode ser combinado de forma harmoniosa. Isso é o que os DJs vêm fazendo há algum tempo --nós estamos apenas modernizando o conceito de música com imagem.

Dinheiro pode não dar em árvores, mas chocolate, sim

Nancy O'Donnell,
do Albany Times Union

Como faltam apenas alguns dias para o Dia dos Namorados (Valentine's Day, comemorado em 14 de fevereiro nos Estados Unidos), achei que seria divertido dar uma escapadela até o sul, indo à terra na qual é produzido aquele delicioso chocolate que derrete na boca.

O chocolate na verdade tem início como semente da fruta do cacaueiro, cujo nome científico é Theobroma cacao. É uma árvore sempre verde que pode chegar a 20 metros de altura caso não seja podada.

Ela é uma das poucas árvores cujas flores e frutos ficam diretamente afixados ao tronco. O cacaueiro cresce nas florestas tropicais da África, da América Central e da América do Sul que ficam entre a faixa delimitada pelas latitudes de 10º ao norte e ao sul do Equador, o que garante a presença de calor, umidade e muita chuva durante o ano inteiro.

O cacaueiro começa a frutificar aos quatro anos de idade, e é considerado plenamente maduro aos dez.

Dentro do fruto, que tem o formato e o tamanho de uma bola de futebol
americano, há de 30 a 50 sementes (que na verdade são uma espécie de noz). Os frutos são ligados ao tronco da árvore, e levam seis meses para se desenvolver. Eles assumem uma coloração que varia do roxo-amarronzado ao dourado-avermelhado, dependento da variedade.

Existem três variedades básicas de cacaueiros usados para a produção do
chocolate: o criollo, responsável por entre 10% e 15% da produção mundial; o forastero, responsável por quase 70%; e o trinitario, uma mistura das duas variedades anteriores, que gera cerca de 20% da produção.

Assim que amadurecem, os frutos são retirados das árvores com facões, as sementes são removidas e colocadas para fermentar por aproximadamente uma semana. Esse processo ajuda a reduzir o amargor do produto e a aumentar o seu aroma.

A seguir os grãos são limpos, selecionados, embalados e exportados para os países processadores. Os Estados Unidos são o segundo maior importador, e a Suíça o primeiro.

Quando esta matéria prima é processada para criar o chocolate, é necessária a adição de leite, açúcar, nozes e amêndoas, o que faz do chocolate uma indústria agrícola bastante viável para os Estados Unidos.

Estima-se que cada norte-americano coma 5,5 quilos de chocolate por ano. Para aqueles que não comem a sua parcela, não há o que temer: eu como por vocês, especialmente por volta das cinco horas, durante o café da manhã!

Mas o que torna essa árvore ainda mais impressionante sob um ponto de vista agrícola é a sua relação íntima com o meio-ambiente. A sobrevivência do cacaueiro depende fortemente das copas de centenas de espécies diferentes de árvores mais altas que pairam sobre ele.

O cacaueiro prospera à sombra dessas copas, também conhecidas como cabrucas, mas, o que é mais importante, ele sobrevive por meio da interação com insetos benéficos, pássaros e outros pequenos animais que vivem no topo das árvores.

A intensidade dessa interdependência se tornou evidente há algumas décadas, quando plantações de cacau foram cultivadas a quilômetros da floresta. A produção dos frutos despencou a tal ponto que menos de 5% das centenas de flores de uma única árvore geraram frutos.

Vários estudos revelaram que uma mosca pequena e potente que é responsável pela polinização das flores do cacau não se fazia presente, ou só aparecia em quantidade mínima, nessas plantações distantes das florestas, resultando em uma grande interrupção do processo de fertilização. Além disso, parasitas naturais, insetos benéficos e outros predadores que devoram uma larva destruidora dos frutos não existiam em número suficiente nessas culturas.

Atualmente, os cultivadores desse produto consumido no mundo inteiro não são os megafazendeiros modernos, mas sim aqueles agricultores que operam em escala familiar. Existem cerca de seis milhões dessas pequenas propriedades de um a dois hectares, que operam harmonicamente com a camada superior das florestas, produzindo um total de quatro milhões de toneladas de cacau anualmente. Devido às pesquisas e a uma melhor compreensão do papel importantíssimo desempenhado pelas incontáveis relações simbióticas presentes nas copas das árvores, muita gente acredita que o cacaueiro pode ser um dos elementos para a salvação das florestas tropicais.

Assim, na quarta-feira, quando a sua cara-metade lhe der aquela caixa de chocolates em formato de coração, e você saborear uma barra, não se sinta culpado nem conte as calorias consumidas.

Em vez disso, pense: "A cada pedaço que como, estou ajudando a salvar as florestas tropicais". E isso não é uma piada.

Trem atropela e mata quatro jovens no interior de São Paulo

Quatro jovens morreram atropelados por um trem na madrugada deste domingo, em Brotas (245 km de São Paulo).

Segundo a Polícia Militar da cidade, o maquinista Luiz Carlos Serra, 43, disse que, para evitar o acidente, ainda buzinou e deu sinais de luz, mas os quatro --Clenildo Rogério Primo, 19, e Odair Sérgio Primo, 17, e outros dois não-identificados-- não reagiram. O acidente aconteceu por volta das 5h em um cruzamento na Fazenda Lagoa, a 11 km do centro de Brotas.

O maquinista também disse, ainda segundo a PM, que, na rota Jundiaí-Bauru, é comum encontrar "surfistas de trem" --jovens que esperam à margem do trilho para pegar carona em vagões de carga.

De acordo com a perícia de Rio Claro (175 km de São Paulo), que chegou ao local por volta das 8h30, no momento do acidente os quatro jovens deveriam estar dormindo sobre os trilhos. No local havia marcas de fogueira e mochilas com roupas e objetos pessoais.

Um perito da Polícia Civil de Rio Claro, que esteve no local e preferiu não ser identificado, disse que o acessório usado na frente do trem para desviar objetos do trilho acabou "puxando" os corpos para debaixo do trem, mutilando-os.

O perito também disse que os corpos foram levados para o IML (Instituto Médico Legal) de Rio Claro, onde serão realizados exames toxicológicos para saber se os jovens ingeriram drogas antes do acidente. O laudo sai em dez dias úteis.

Mutiladas, duas das vítimas só foram reconhecidas por documentos de identificação que estavam nas mochilas. Os outros dois jovens, que aparentam ter entre 18 e 20 anos, continuam no IML e devem ser identificados ainda hoje, diz o perito. O acidente, registrado na delegacia de Brotas, será investigado pela Polícia Civil de Rio Claro.

sexta-feira, fevereiro 09, 2007

"COMO SE FUDER NO SHOW DO LOS HERMANOS"

Voltei para o Brasil há pouco tempo. Vivia com minha família na Inglaterra desde garoto. Estou morando no Rio de Janeiro há uns três meses e agora estou começando a me enturmar na Universidade. Não sei de muita coisa do que está rolando por aqui, então estou querendo entrar em contato com gente nova e saber o que tá acontecendo no meu país e, principalmente, entrar em contato umas garotas legais, né?

Mas foi meio por acaso que eu conheci uma garota maneiríssima chamada Tainá. Diferente esse nome, hein? Nunca tinha ouvido. Estava procurando desesperadamente um banheiro no campus quando vi uma porta que parecia ser um. Na verdade,era o C.A. da Antropologia. Uma garota já foi logo me perguntando se eu queria me registrar em algum movimento estudantil de não sei lá o que. Pensei em dizer que estava precisando cagar muito rápido, mas ela era tão gata que eu falei que sim. Tainá: cabelos pretos, baixinha e com uma estrutura rabial nota dez... Aí, acho que ela me deu um certo mole... Conversa vai, conversa vem, ela me chamou para um show de uma banda hoje à noite que eu nunca tinha ouvido falar: Loser Manos. Nome engraçado esse! Estava fazendo uma força sobre-humana para manter a moréia dentro da caverna, mas realmente tava foda. Continuamos conversando e rindo. Ela riu até bastante, mas eu, na verdade, tava mesmo rilhando os dentes porque assim ficava mais fácil disfarçar as contrações faciais que eu estava tendo ao travar o cu para não cagar ali mesmo na frente dela.

Pensando bem, eu tinha ouvido falar alguma coisa sim sobre essa banda lá na europa ainda, mas não me lembro bem o quê. Ah, acho que vi esses caras no noticiário local dando uma entrevista. Achei que fosse uma banda de crentes tradicionalistas tipo Amish.Todos de barba, com umas roupas meio fudidas. Parecia até a Família Buscapé! Dão a impressão de ser uns sujeitos legais, mas o que me chamou a atenção mesmo foi o jeito da repórter, como se fosse a fã nº 1 deles, como se estivesse cobrindo a volta do Beatles ou coisa parecida. Não entendi esse jeito "vibrão" de trabalhar. Bom, mas se eu conseguir ficar com o bicho bom da Tainá hoje à noite, já tô no lucro! Marcamos de nos encontrar na entrada do ginásio. Rapaz, acho que tô dando sorte aqui no Brasil! Ia ser fácil achar essa garota no meio da multidão. Ela se veste de uma maneira estilosa, diferente, bem individual: sandália de dedo, saia indiana, camiseta de alça, uma bolsa a tiracolo e o mais interessante: um óculos fininho, de armação escura, grossa e retangular, engraçados até! Depois de uns mil "Desculpe, achei que você fosse uma amiga minha.", finalmente encontrei Tainá e seu grupo de amigos. Cacete, isso sim é que é moda! Parecia uniforme de escola!

Ela me apresentou suas amigas, Janaína e Ana Clara e seus respectivos namorados, Francisco e Bento. Uma mistura de fazendeiros com intelectuais. Uns caras de macacão, óculos e de sandália de pneu e com ar professoral. Pareciam ser legais, "do bem" como eles mesmo falam... Mas que não me deram muita conversa. "Do bem", isso mesmo! Gíria nova... Todos aqui são "do bem". E que nomes tão simples! Janaína, Ana Clara, Francisco, Bento e Tainá. Nada de Rogérios ou Robertos. E eu já tava me sentindo meio culpado por me chamar Washington... Realmente estava no meio de uma nova época da juventude universitária brasileira!

Comecei a conversar com a Tainá antes que a banda entrasse no palco. Aí, acho que tá rolando uma condição até! Quem sabe posso me dar bem hoje? Ela começou a falar de música: "Quem você gosta em musica?", perguntou.

- Pô, eu me amarro no George..."

Ela imediatamente me interrompeu, dizendo alto: "Seu Jorge? Eu também amo o Seu Jorge!" Puxa, que legal! Ela gosta tanto do George Harrison que se refere a ele com uma intimidade única! Chama ele de "Seu"! Seu Jorge! Isso é que é fã!

"Legal você já conhecer ele, hein? Eu sabia que ele ia se dar bem na Europa! O Seu Jorge é um gênio!" , ela emendou. Pô, eu morava na Inglaterra. Como eu não ia conhecer o George Harrison? Essa eu não entendi... Depois ela perguntou quais bandas que eu gostava.

"Eu curtia aquela banda da Bahia...". "Ah, Os Novos Baianos, né?? Adoro também!". "Não, Camisa de Vênus! "Silvia! Piranha!" cantei, rindo.

A cara que ela fe z foi de quem tinha bebido um balde de suco de limão com sal. Senti que ela não gostou muito da piada. Tentei consertar: "Achava eles engraçados, mas era coisa de moleque mesmo, sabe?" Óbvio que não funcionou... Aí, acho que dei um fora... Depois, Tainá foi me explicando que o tal Loser Manos é a melhor banda do Brasil, etc., etc., etc., e que eles "promovem um resgate da boa música brasileira". "Tipo Os Raimundos com o forró?", perguntei. "Claro que não!", disse ela meio exaltada! Ela me falou que não se pode comparar os Los Hermanos com nada porque "eles são únicos", apesar de hoje se ter excelentes artistas já reverenciados pela mídia do Rio de Janeiro como Pedro Luis e a Parede, O Rappa, Ed Motta, Paulinho Moska, Orquestra Imperial, Max de Castro, Simoninha e Farofa Carioca. Ela mencionou também "Marginalia" ou coisa parecida. Foi isso mesmo que eu ouvi? Achei que ela estivesse elogiando eles... Esses foram os nomes artísticos mais escrotos que já ouvi, mas fiquei quieto.

Fico feliz em saber isso pois quando me mudei o que fazia sucesso no Rio era Neuzinha Brizola e seu hit "Mintchura". Ainda bem que tudo mudou, né?

Só depois percebi que o nome da banda é em espanhol: Los Hermanos. Ah bom! Mas se eles são tão brasileiros assim porque não se chamam "Os Irmãos"? Quando saí daqui os nomes de muitas bandas costumavam ser em inglês e até em latim. Ainda bem que essa moda de nomes de bandas em espanhol não pegou por no Brasil! Pelo que me lembro, ao explicar qual é a dos "Hermanos", ela usou a expressão "do bem" umas 37 vezes e disse que eles falam de romantismo, lirismo, samba, brasilidade e circo. Legal, mas circo? Pô, circo é foda! Uma tradição medieval que ganha dinheiro maltratando animais. Onde está a poesia de ver um urso acorrentado pelo pescoço tentando se equilibrar miseravelmente em cima de uma bola enquanto é puxado pelo pescoço por uma corrente e por um cara com um chicote na mão? Rá, rá, rá... Engraçado pra caralho! Na boa, circo é meio deprimente. Palhaço de circo só troca tapão na cara e espirra água nos olhos dos outros com flor de lapela e qua ndo sai do picadeiro, vai chorar no camarim. Que merda! A única coisa legal no circo mesmo é quando ele pega fogo. Isso sim que é um espetáculo de verdade! Aquela correria toda, etc. Senti que essa galera se amarra em circo. Não faz sentido se eles são tão politicamente corretos assim, né? E os pobres animais? E eu querendo não passar em branco com a conversa com a Tainá, mas não conseguia lembrar de jeito nenhum a única coisa que eu sabia sobre a banda... Cacete...!

O que era mesmo?

De repente, uma gritaria histérica! O show tava começando! O ginásio veio a baixo! Perguntei pra ela: "Eles são todo irmãos, né, tipo o Hanson?" Ela disse um "não" esquisito, como se eu tivesse debochando. Todos eles usam uma barba no estilo Velho Testamento e se chamam "Los Hermanos"! O que ela queria que eu pensasse? Após ouvir a primeira música deu pra ver que os caras são profissionais mesmo, tocam bem e são completamente idolatrados pelo público, para dizer o mínimo. Fiquei prestando atenção ao show. Tem uma influência de Weezer, Beatles e Chico Buarque. Esse aí é fodão, excelente compositor mesmo. Lá na Inglaterra conhecia uns caras que eram ligados ao movimento "Dark", como chamam por aqui. São os sujeitos que gostam de Bauhaus, Sister of Mercy, The Cure, etc. E tem a maior galera aqui no Brasil também que se veste de preto, não toma sol, curte um pessimismo niilista e se amarra nessas bandas. Mas se eles sacassem que o Chico Buarque é o genuíno artista "Dark" brasileiro. Pô, é só ouvir as músicas dele pra perceber: "Morreu na contra-mão atrapalhando o tráfego" ou "O tempo passou na janela é só Carolina não viu". "Pai, afasta de mim esse cálice, de vinho tinto de sangue" ou "Taca pedra na Geni, taca bosta na Geni, ela é boa pra apanhar, ela é boa de cuspir, ela dá pra qualquer um, maldita Geni". Tudo alegrão, né? Se eu fosse dark, só ia ouvir Chico Buarque, brother! Tentei reengatar a convera dizendo que achava ao baixista o melhor músico dos Los Hermanos. Ela res pondeu, meio irritada: "Mas ele não é da banda!" Como eu ia saber?O cara tem barba também! Aí, não tô entendendo mais nada...

Adiante ela me disse que o cara que ela mais gostava era um tal de Almirante. Depois de alguns minutos deu pra ver que o camarada imita um pouco os trejeitos do Paul McCartney, só que em altíssima rotação. Ele fica se contorcendo feito um maluco enquanto os outros ficam estáticos. É engraçado até! Parece que ele tem uma micose num lugar difícil de coçar! E fica falando e rindo direto. Ele é o irmão gaiato do cara que canta a maioria das músicas, o tal de Marcelo Campelo, como anunciaram no noticiário local. Isso mesmo, Marcelo e Almirante Campelo: "Os Irmãos"! Legal! Já tava me inteirando! Ah, e tem também dois gordinhos de barba que estão lá também, mas devem ser filhos de outro casamento...

Tava um calor desgraçado, coisa que eu realmente não estou acostumado. Fui rapidão ao bar pra beber alguma coisa. Comprei umas quatro latas de refrigerante que era o único troço que tava gelado para oferecer para meus novos amigos: "Aí, trouxe umas Coca-colas pra vocês!" Ouvi a seguinte resposta: "Coca-cola? Isso é muito imperialista... guaraná é que é brasileiro!" Puxa, que pessoal politizado... Isso mesmo, viva o Brasil! "Yankees, go home", rá, rá! Outro fora que eu dei! Mas, pensando bem, eles não usam o Windows e o Word pra fazer trabalhos da universidade? Ou usam o "Janelas"? Dessas coisas gringas não é tão mole de abrir mão, né? Mais fácil não tomar Coca-Cola! Isso sim que é ativismo estudantil consciente! Posicionamentos políticos à parte, tava quente pra caralho, então bebi tudo mesmo sob o olhar meio atravessado de todos eles... fazer o quê?

Lá pelas tantas, começou uma música e todo mundo berrou e pulou. Parecia o fim do mundo. Logo nos primeiros acordes, reconheci o som e falei pra Tainá: "Ah, eu sei o que é isso! É um cover do Weezer! Me amarro em Weezer!" Ela olhou pra mim com uma cara indignada e disse: "Que Weezer o quê? O nome dessa música é "Cara Estranho". Já vi que não gostou de novo... Mas quem sou eu pra dizer algum coisa aqui, né? Porra, mas que parece, parece! Mas o que era mesmo que eu não consigo lembrar de jeito nenhum sobre eles? Acho que conheço alguma outra música deles... Só não consigo dizer qual...

Sabia que se eu quisesse me dar bem logo com a Tainá teria que ser entre uma música e outra pois parecia que ela estava vendo um disco voador pousar enquanto os caras tocavam. Resolvi fazer uma piada que sempre rola em shows. Quando o Campelo tava falando alguma coisa qualquer, berrei: "Filha da putaaaaaaaaaa!"

Pra que? Tainá e sua milícia hermanista me deram uma cutucada na costela que me fez perder o ar! Pô, todo show rola isso! É quase uma tradição até! E é só uma piada! Aí, esse pessoal leva tudo muito a sério! Caralho... Pensei em pegar uma camisinha da minha carteira e fazer um balão e jogar pra cima, como rola em todo show, pra mostrar pra Tainá que eu sou uma cara consciente, tipo: "Aí, Tainasão, se tu quiser, eu tô preparado!", mas depois dessa vi que senso de humor não é o forte dessa galera...

O tempo tava passando e nada de eu pegar a minha nova amiguinha. Quando fui tentar falar uma coisa no ouvido dela, foi o exato momento em que começou uma outra música. Foi aí que a louca deu um grito e um pulão tão altos que eu levei uma cabeçada violenta bem no meio do meu queixo! Ela não sentiu nada, óbvio, pois estava em transe hipnótico só por causa de uma canção sobre a beleza de ser palhaço ou lirismo do samba ou qualquer sacanagem do gênero. A porrada foi tão forte que eu mordi um pedaço da minha língua. Minha boca encheu d?água e sangue na hora. Enquanto eu lutava pra não desmaiar, instintivamente enfiei a manga da minha camisa na boca pra estancar o sangue e não cuspir tudo em cima de Ana Claudia e Jandaína or something. Só que estava tão tonto com a cabeçada que tive que me segurar em uma ou outra pessoa pra não cair duro no chão. Foi quando ouvi: "Nossa, que horror! Lança-perfume! Esse playboy tá doidão de lança! Que decadência..." Lança-perfume? Cara, lógico que não! E mesmo que tivesse, todo show tem isso! Mas nesse, não pode. É "do bem". É feio ter alguém cheirando loló!! Pô, todo show que eu fui na vida tinha alguém movido a clorofórmio. Que merda...

Babei na minha camisa até o ponto dela ficar ensopada! Fui ao banheiro tentar me recuperar do cacete que tomei. Lavei o rosto e tirei a camisa. Quando voltava passei por uma galera e ouvi resmungarem alguma coisa do tipo: "...e esse mala aí sem camisa..." Porque não se pode tirar a camisa num show? Isso aqui não é só uma apresentação de uma banda? Parecia que eu ainda estava na Europa! Regulões do caralho... E, afinal, o que significa "mala"?

Estava enxergando tudo embaçado e notei que minhas lentes de contato tinham saltado pra longe com a cabeça-ariete de Tainá e esmagadas por centenas de sandálias de dedo. Lembrei que sempre levo um par de lentes extras no bolso. É uma parada moderna que eu achei lá em Londres. Um estojo ultrafino com uma película de silicone transparente dentro que mantém as lentes umedecidas e prontas para uso. Abri o estojo e peguei cuidadosamente a película com as duas mãos e elevei-a contra a luz para conseguir achar as lentes. Estiquei os polegares e indicadores, encostando uns nos outros, para abrir a película entre esses dedos. Balançava o negócio levemente, de um lado para o outro, contra a pouca luz que vinha do palco para conseguir localizar as lentes. Não estava enxergando nada direito! Quando tava lá com as mãos pra cima, fazendo uma força do caralho pra achar a porra dessas lentes, um dos caras legais com nomes simples, me deu um puta safanão no ombro. É claro que o silicone voou longe também. Caralho, minhas lentes! Custaram uma fortuna! Que filho da puta!

"Que sinal é esse que tu fazendo aí, meu irmão? Tá desrespeitando as meninas?" "Que sinal, que sinal?", respondi, assustado. "Buceta, palhaço!", apertando o meu braço que nem um aparelho de pressão desregulado. "Você tá no show do Los Hermanos, ouviu? Los Hermanos! Ninguém faz sinal de buceta em um show do Los Hermanos, sacou?", gritou o tal hipponga na minha cara. Que viado, eu não tava fazendo nada! Parece uma freira de colégio! Que lance é essa de buceta? Da onde esse prego tirou isso? As meninas... (Perái! Menina? A mais nova aí tem uns 25!) ficaram me olhando com a cara mais escrota do mundo! A essa altura, já tinha percebido que não ia agarrar a Tainá nem que eu fosse o próprio Caetano Veloso! "Bento", que nome mais ridículo... Isso aqui é um show ou uma reunião de alguma seita messiânica escolhida para repovoar a Terra? Caralho, que noite infernal. T ava com a língua sangrando, sem enxergar direito, só de calça, arrotando sem parar e puto da vida porque só tinha aceitado vir aqui por causa de mulher. Estava no meu limite. Isso era um show ou uma convenção do Santo Daime? Que patrulhamento! E, de repente, vejo Tainá e seus amigos olhando pra mim atravessado e cantando a seguinte frase: "Quem se atreve a me dizer do que é feito o samba?" Aí foi demais! Aí, eu me atrevo: Ritmo, melodia e harmonia. Pronto, só isso! Mais nada! Olha só: foda-se o samba, foda-se o circo, foda-se a obsessão por barba da família Campelo e, principalmente, foda-se essa galera "do bem" que está aqui!" Apesar de tudo, a banda é realmente excelente! O que incomoda mesmo é esse público metido a politicamente correto e patrulhador e a imprensa que força a barra pra vender alguma imagem hipertrofiada do que rola de verdade. Esse climão de festival antigo de música popular brasileira, daqueles com imagens em preto e branco, com todo mundo participando, que volta e meia reprisam na tv. "Puxa vida, um novo movimento musical brasileiro?" "Estamos realmente resgatando a nossa cultura!" ? Ei, é só música pop!

MÚSICA POP! Caralho, finalmente lembrei! Eu conheço uma música deles! Ouvi em Londres! Numa última tentativa de salvar meu filme com Tainá, na hora do bis, berrei bem alto: "TOCA ANA JULIA!" Só acordei no hospital. Tomei tanta porrada que vou ter que fazer uma plástica pra tirar as marcas de pneu da minha cara! Fui pisoteado! Neguinho ficou puto! Qual é o problema com essa música? Me lembro de estar sendo chutado pela elite dos estudantes universitários brasileiros e da própria Tainá, gritando e me dando um monte de bolsada na cabeça! Que porra louca! Tentaram me linchar! Ofendi todo mundo! Pô, Ana Julia é uma música boa sim! É um pop bem feito! Se não fosse, o "Seu Jorge" Harrison não teria gravado, né? Se ele não entende de música, quem entende? Me disseram depois que o tal Campelo se retirou do palco chorando, magoado, e o outro irmão mais novo dele, o nervosinho que imita o Paul McCartney, pulou do palco pra me chutar também. Do bem? Do bem é o cacete... Aí, sinceramente, ainda prefiro o Camisa de Vênus...

Felipe Lantimant

quinta-feira, fevereiro 08, 2007

Universidades paulistas

MARIA SYLVIA CARVALHO FRANCO

UM LEITOR, docente universitário, escreveu-me que deixou de votar por "fadiga eleitoral, saturado da mesmice sem futuro e da corrupção". Grave desencanto, diante da vida pública sem grandeza, plena de meganegociações e microfinalidades.
O olhar político fecha-se no cálculo financeiro, apto a salvar protagonistas em situação difícil, no caso, apertos orçamentários do governo Serra. Caiu do céu o corte de recursos e a ingerência nas universidades públicas paulistas. Serra ignorava (dizem tucanos) que as verbas dessa área seriam afetadas, que a mudança nela interposta se dera à revelia dos reitores. Mas as intervenções foram sistêmicas: veto a recursos aprovados no Legislativo; retenção "temporária" de verbas, monitoramento das universidades por secretaria específica; interferência no Conselho de Reitores; gestão financeira submetida à burocracia oficial. Serra lamentou a falta de informação aos reitores, pois, cientes, pressionariam a Assembléia no debate orçamentário.
Custa crer que uma instituição de Estado, essencial à soberania do país, seja assim instrumentalizada. As justificativas desse afã centralizador se auto-anulam. Alega-se o "aprimoramento contínuo das universidades e participação no desenvolvimento do país", invocando melhoria do ensino básico, controle do desemprego, combate à exclusão, uso de privilégios em favor do povo, segundo a retórica dominante. À universidade não cabe responder diretamente a tais ações, e a dita ínfima quantia a ser dela subtraída torna irrisória qualquer prática nesses campos. Só o orçamento da Secretaria da Educação prevê cerca de R$ 11 bilhões, mais de duas vezes o das universidades. A excelência em pesquisa e ensino superior tem preço alto (em mil sentidos), mas cada minuto, zelo e centavo nela investidos geram riqueza material e humana e fazem da universidade a mediação chave para enfrentar aqueles desafios em âmbito nacional, para além de limites estaduais. Quanto à inclusão social, as três universidades aplicam, com sucesso, soluções adequadas às suas estruturas e meios.
Vincular autonomia universitária a "função social" e confundir liberdade com "fazer o que quer" é deplorável. Determinar, de fora, o processo cognitivo é sustar e perverter sua dinâmica e sentido. E "história pessoal" não avaliza intenções: poderosos, não raro, a desmentem. Espanta que universitários ensaiem o retrocesso de sua própria matriz: de triste memória é o sucateamento das universidades federais na era FHC. Explica-se, por aí, o "baccia mano" de seus reitores ao candidato Lula. Dessa mácula saíram imunes os autônomos campi paulistas.

Brasil terá padrão de vida 'europeu' em 2050, diz estudo


da BBC, em Londres


Em 2050, a renda per capita no Brasil será equivalente à existente hoje na Europa, segundo um estudo sobre o futuro da economia dos países que compõem o grupo conhecido como BRIC (sigla para Brasil, Rússia, Índia e China) divulgado em Londres.

"O Brasil não estará tão bem quanto a China e a Índia, mas é possível dizer que, com base na renda per capita, daqui a 45 anos, os brasileiros terão um padrão de vida equivalente ao existente hoje (2005) na Europa", disse à BBC Brasil o autor das projeções, Peter Gutmann, analista da consultoria Experian Business Strategies.

Segundo o estudo, a renda per capita (cálculo do valor do PIB dividido pela população) no Brasil será de US$ 27,13 mil em 2050 (cerca de três vezes maior do que a medida atual), um valor apenas um pouco inferior à renda per capita na Europa (países que adotaram o euro) em 2005, que ficou em US$ 29,47 mil.

O autor reconhece que o cálculo da renda per capita serve apenas de parâmetro para a comparação já que fatores como a má distribuição de renda podem impedir que o crescimento da economia previsto beneficie a maior parte da população.

Estados Unidos


No quesito renda per capita, os Estados Unidos, incluídos nas projeções para servir de base para comparação, continuarão muito à frente da China que será, então, a maior economia do mundo.

De acordo com as previsões, a renda per capita americana terá subido de US$ 41,30 mil em 2005 para US$ 100,08 mil em 2050.

Nesse patamar, será cerca de 30% maior do que a da China e em torno de 350% maior do que a renda per capita no Brasil.

A renda per capita na Índia ficará em US$ 36,21 mil e na China, em US$ 74,40.

Segundo Gutmann, o maior risco para que as previsões se tornem realidade está na dúvida sobre se os recursos do planeta darão conta da maior demanda por tanto tempo.

"Mudança climática, devastação de grandes áreas e esgotamento de recursos naturais já estão ocorrendo. O risco é que os recursos, simplesmente, não consigam sustentar o crescimento projetado", disse Gutmann.

Poder de compra

O estudo feito pela Experian Business Strategies e divulgado pela consultoria Grant Thornton International calcula o valor do Produto Interno Bruto dos quatro países e também dos EUA com base na PPC (Paridade do Poder de Compra ou ou Purchase Power Parity, em inglês).

Com isso, a base de 2005 considera o PIB brasileiro em US$ 1,53 trilhão, o da Rússia em US$ 1,58 trilhão, o da Índia em US$ 3,66 trilhões e o da China em US$ 8,88 trilhões.

Segundo as projeções, o Brasil crescerá, em média, 3,5% ao ano até 2050, quando a economia brasileira valerá US$ 7,22 trilhões, ou seja, será quase cinco vezes maior do que foi em 2005, medida com base na PPC.

O estudo segue o caminho aberto pela Goldman & Sachs que, em 2003, cunhou a sigla BRIC prevendo que os quatro países seriam superpotências em 2050.

Otimismo

Outro capítulo do relatório, que fala sobre otimismo nos BRICs, diz que o empresariado brasileiro é o mais pessimista entre os emergentes que compõem o grupo.

A Índia está no topo da lista que elenca 32 países de acordo com o percentual de empresários que se declararam otimistas para os próximos 12 meses. Segundo a pesquisa, que ouviu 7,2 mil empresários, 97% dos indianos estão otimistas.

No Brasil, 47% se declararam otimistas, na Rússia, 57%, e na China, 86%. A média global foi de 45%.

Segundo a pesquisa, dificuldades para se conseguir empréstimos, escassez de financiamento de longo prazo e pessimismo com as exportações ajudam a explicar o resultado do Brasil.

quarta-feira, fevereiro 07, 2007

"Vagabundo" diz que trabalha desde os 10 e que votou na chapa Serra/Kassab

LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL

Ainda com dor de dente, o microempresário Kaiser Paiva Celestino da Silva, 47, disse que perdoa o prefeito Gilberto Kassab (PFL), que anteontem enxotou-o de um posto de saúde em São Paulo, xingando-o de "Vagabundo, vagabundo".
Kaiser recusou a ajuda em dinheiro oferecida por um programa vespertino de televisão. "Eu sou trabalhador, não aceito esmola", disse no ar. Em vez disso, ofereceu-se para adesivar e pintar o ônibus da emissora de TV -remuneradamente, é claro, "porque senão vicia o cidadão", disse, citando.
Na casa da rua Cecília Calovini, na Vila Zatt, que Kaiser divide com a mulher, Lúcia, com os filhos Samuel, 7, e Maiara, 5, e com a oficina de cartazes praticamente desativada desde o final do ano passado, por causa da Lei Cidade Limpa (que restringe a publicidade exterior), o aluguel está atrasado. Credores são driblados à custa de empréstimos de vizinhos e parentes. Também a igreja evangélica Cristo Centro dá uma força.
Anteontem, nem era para Kaiser ter ido ao posto de saúde Pereira Barreto, bairro de Pirituba, onde o prefeito Kassab inaugurava uma unidade de assistência médica ambulatorial. Quem costuma levar as crianças ao médico é Lúcia. Mas a mulher tinha outro destino -conseguir alguém que ajudasse nas contas de água e luz, antes que as concessionárias cortassem o fornecimento.
Sobrou para Kaiser levar os potinhos com fezes e urina das crianças ao posto, conforme pedido médico de 31 de janeiro. Aproveitaria para pedir que algum dos dentistas extirpasse o dente do ciso do lado esquerdo, inflamado e latejando. Não foi atendido (encaminharam-no para outro posto, na Vila Zatt, onde ele está cadastrado).
Kaiser estava confuso, sob efeito de calmantes, quando falou à Folha, mais de 24 horas depois do "Vagabundo, vagabundo". Na pizzaria vizinha, o funcionário conta que viu quando o homem chegou em casa, "chorando como criança".
Líder comunitário, ex-membro do conselho do parque Rodrigo de Gasperi (perto de sua casa), diplomado em cursos de responsabilidade social no terceiro setor, Kaiser diz que votou na chapa José Serra/Kassab em 2004. "Foi o meu filho Samuel que, na cabine indevassável, digitou o número 45", conta. O menino aprova.
O mesmo Samuel acompanhava Kaiser anteontem no posto de saúde. Assustado com a gritaria, o menino escondeu-se atrás de um poste do outro lado da rua. Ontem, Samuel se lembrava da primeira coisa que disse ao pai, depois do incidente: "Pai, por que ele chamou você de vagabundo?"
"Isso é o que mais dói. Eu trabalho desde os dez anos", diz Kaiser, órfão de pai e mãe que ajudou a criar os cinco irmãos menores.
Logo depois da confusão, a prefeitura soltou uma nota oficial em que dizia que Kaiser estava no posto de saúde Pereira Barreto só "para tumultuar", já que ele e seu filho "são cadastrados na Vila Zatt". Ontem, a assessoria de imprensa da secretaria da Saúde admitiu que os filhos do microempresário são pacientes do posto de saúde Pereira Barreto.

quinta-feira, fevereiro 01, 2007

Serra retém verba da USP, Unesp e Unicamp

FÁBIO TAKAHASHI
da Folha de S.Paulo

Pela primeira vez desde a obtenção da autonomia universitária, em 1989, o governo estadual paulista reteve, neste ano, recursos destinados à USP, à Unesp e à Unicamp. A contenção de verbas feita pelo governo José Serra (PSDB) ocorreu de duas formas. Uma delas foi por meio da suspensão do repasse mensal para as instituições.

Em uma das suas primeiras medidas após tomar posse, Serra determinou o contingenciamento (reter temporariamente parte do Orçamento) de 15% do custeio e 100% dos investimentos dos órgãos do governo. Em contingenciamentos anteriores, inclusive no do ano passado, as universidades não sofreram com a medida.

A outra retenção ocorreu por meio da diferença que deveria ser repassada referente à arrecadação de dezembro do ICMS (principal imposto paulista). Mensalmente, as três escolas recebem 9,57% da previsão da arrecadação do ICMS. Caso o arrecadado seja maior do que o previsto, o governo paga a diferença no mês seguinte. Em janeiro deste ano, o dinheiro não foi repassado integralmente.

Devido às duas ações do governo, a Unesp recebeu apenas R$ 2,4 milhões dos R$ 12,7 milhões no último dia 22. A instituição afirma que teve de usar suas próprias reservas para pagar despesas com o hospital universitário, bolsas e aquisição de material. Já a Unicamp recebeu R$ 5,5 milhões a menos e teve de cortar compra de materiais e a assinatura de periódicos.

A USP informou uma perda de R$ 11,5 milhões e afirmou que ainda avalia tal impacto. O secretário de Ensino Superior, José Aristodemo Pinotti, disse que o contigenciamento é pequeno e que trabalha para revertê-lo.

Para o coordenador do curso de administração pública da Unesp (Araraquara), Álvaro Guedes, não há impedimento jurídico para que o governo faça contingenciamento. "Mas é um sinal de que o tratamento vip às universidades irá parar."

Conselho

Outra mudança que teve impacto negativo nas universidades foi o fato de os reitores não predominarem mais no Cruesp, conselho que os representa. Até então, o conselho era formado pelos três reitores, sendo um presidente, e os secretários de Ciência e Tecnologia (ao qual às escolas eram vinculadas) e o de Educação. Com a criação da Secretaria do Ensino Superior, o conselho passou a ter três secretários e três reitores, sendo que a presidência passou para o titular da pasta de Ensino Superior.

Uma das principais medidas discutidas no Cruesp são os reajustes salariais. Ontem, Pinotti disse à Folha que não será mais o presidente do órgão --o posto voltará a ficar com os reitores. Antes de saber da decisão, o reitor da Unicamp, José Tadeu Jorge, afirmou que "houve uma redução da autonomia com a perda das prerrogativas dos reitores no Cruesp". Sobre as medidas financeiras, ele disse: "O contingenciamento abre um precedente perigoso na gestão das universidades".

Já o vice-reitor em exercício da Unesp, Herman Jacobus Cornelis Voorwald, concorda que há o risco de a autonomia ser afetada. "A mudança do modelo de autonomia, iniciado em 1989, coloca em risco a manutenção da qualidade do ensino, da pesquisa e da extensão nas três universidades", disse. A reitora da USP, Suely Vilela, declarou que "as mudanças propostas pelo governo mostram pontos fundamentais que precisam ser aperfeiçoados".

Outro lado

O secretário de Ensino Superior, José Aristodemo Pinotti, afirmou que o contingenciamento 'é pequeno' e negou que haja intenção de alterar a autonomia das universidades.

A reportagem procurou também a assessoria do governador José Serra (PSDB), que disse que apenas o secretário Pinotti responderia às questões.

Sobre o contingenciamento das parcelas mensais às universidades, o titular da pasta disse que o governo tomou cuidado para que a medida não atingisse a folha de pagamento, responsável por 90% das despesas dessas instituições.
'Por isso esse contingenciamento não tem tanta importância. Mesmo assim, estou negociando com [as secretarias da] Fazenda e Planejamento para que isso não ocorra', disse.

Sobre o repasse da diferença da arrecadação do ICMS, Pinotti afirmou que não pôde destinar integralmente os recursos porque o Orçamento 2007 não foi aprovado.

Dessa forma, essa transferência teve de seguir a lógica da distribuição das cotas mensais --ou seja, o pagamento de apenas 1/12 do valor a cada mês.

A assessoria de imprensa da Unesp afirmou que, em outros anos, mesmo com o Orçamento ainda não aprovado, não havia retenção desses recursos, devido ao fato de a verba já ter sido aprovada na lei orçamentária do ano anterior (no caso em questão, de 2006).

A Secretaria de Ensino Superior declarou que desconhece tal fato e afirmou que só poderá repassar a verba integralmente quando ela constar do Orçamento 2007 e ele for aprovado na Assembléia Legislativa.

Com relação ao temor de que haja uma mudança na autonomia universitária, Pinotti negou tal intenção. 'Para que isso fique mais claro, pedi que o governador me retire da presidência do Cruesp. A decisão deve ser publicada no 'Diário Oficial' amanhã [hoje].'

A reitora da USP, Suely Vilela, foi avisada ontem que voltará a chefiar o conselho. A presidência tem vigência de um ano e é alternada pelos reitores.