MARIA SYLVIA CARVALHO FRANCO
UM LEITOR, docente universitário, escreveu-me que deixou de votar por "fadiga eleitoral, saturado da mesmice sem futuro e da corrupção". Grave desencanto, diante da vida pública sem grandeza, plena de meganegociações e microfinalidades.
O olhar político fecha-se no cálculo financeiro, apto a salvar protagonistas em situação difícil, no caso, apertos orçamentários do governo Serra. Caiu do céu o corte de recursos e a ingerência nas universidades públicas paulistas. Serra ignorava (dizem tucanos) que as verbas dessa área seriam afetadas, que a mudança nela interposta se dera à revelia dos reitores. Mas as intervenções foram sistêmicas: veto a recursos aprovados no Legislativo; retenção "temporária" de verbas, monitoramento das universidades por secretaria específica; interferência no Conselho de Reitores; gestão financeira submetida à burocracia oficial. Serra lamentou a falta de informação aos reitores, pois, cientes, pressionariam a Assembléia no debate orçamentário.
Custa crer que uma instituição de Estado, essencial à soberania do país, seja assim instrumentalizada. As justificativas desse afã centralizador se auto-anulam. Alega-se o "aprimoramento contínuo das universidades e participação no desenvolvimento do país", invocando melhoria do ensino básico, controle do desemprego, combate à exclusão, uso de privilégios em favor do povo, segundo a retórica dominante. À universidade não cabe responder diretamente a tais ações, e a dita ínfima quantia a ser dela subtraída torna irrisória qualquer prática nesses campos. Só o orçamento da Secretaria da Educação prevê cerca de R$ 11 bilhões, mais de duas vezes o das universidades. A excelência em pesquisa e ensino superior tem preço alto (em mil sentidos), mas cada minuto, zelo e centavo nela investidos geram riqueza material e humana e fazem da universidade a mediação chave para enfrentar aqueles desafios em âmbito nacional, para além de limites estaduais. Quanto à inclusão social, as três universidades aplicam, com sucesso, soluções adequadas às suas estruturas e meios.
Vincular autonomia universitária a "função social" e confundir liberdade com "fazer o que quer" é deplorável. Determinar, de fora, o processo cognitivo é sustar e perverter sua dinâmica e sentido. E "história pessoal" não avaliza intenções: poderosos, não raro, a desmentem. Espanta que universitários ensaiem o retrocesso de sua própria matriz: de triste memória é o sucateamento das universidades federais na era FHC. Explica-se, por aí, o "baccia mano" de seus reitores ao candidato Lula. Dessa mácula saíram imunes os autônomos campi paulistas.
quinta-feira, fevereiro 08, 2007
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