terça-feira, fevereiro 27, 2007

Três dias de seriedade

Terça, 27 de fevereiro de 2007, 09h39
Cláudio Lembo


EFE


Com o início do ano brasileiro, depois que termina o Carnaval, vai-se embora a seriedade
É paradoxal, mas o período de seriedade terminou. Uma vez findo o Carnaval, começa o ano brasileiro. E a seriedade se vai. Cai-se no cotidiano e este é marcado pela ausência de limites. Vale tudo.

Todos os veículos de comunicação, no período de Carnaval, cobrem os acontecimentos com grande acuidade. Só especialistas são chamados a se pronunciar sobre os desfiles de escolas de samba, blocos, enredos, trios elétricos e demonstrações de maracatu. Não vale penetra.

Agora, porém, quando o ano se inicia, todos os fora-de-estrada comparecem. Falam sobre o que sabem e muito mais sobre o que desconhecem. Somos o país dos catedráticos, figura sempre no imaginário nacional.

Vai ser assim, daqui por diante. Até que chegue novo Carnaval e com ele o retorno da seriedade. Só resta, pois, a partir de agora, rir perante o grande circo que se instala.

Há os que entram no picadeiro com a sisudez própria das índoles autoritárias. Outros mantém traços dos dias que se passaram. Estão sempre sorrindo e adiando decisões. Entre uns e outros, são preferíveis os que mantêm o sorriso.

Nada mais chato que a pessoa que se leva a sério.

Já que chegamos aos tempos normais, é importante analisar assuntos que ficaram submersos durante o tríduo governado por Momo, um rei de bom senso.

A reforma política é um deles. Encontra-se em curso no Senado Federal uma emenda constitucional que restabelece a cláusula de barreira, aquela que impede os partidos de frágil densidade eleitoral de manter privilégios.

Deve ser aprovada no Senado, mas na Câmara dos Deputados as coisas são diferentes. Nesta Casa, os parlamentares sabem ser bom contar com múltiplas legendas para eventuais excursões predatórias. Se aqui não dá, lá é possível que o cocho seja mais farto.

Há mais ainda. Caso aprovada a emenda constitucional, existe um risco. Ela ser julgada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. É bom lembrar o julgamento de ação direta de inconstitucionalidade que deu por contrária à Constituição lei ordinária que limitou os direitos dos pequenos partidos no cenário político.

A partir do mesmo argumento, uma emenda constitucional pode ser julgada contra os princípios que formam o sistema constitucional e, entre estes, se encontra implícito o direito das minorias de estar presente no jogo parlamentar.

Aí teremos uma novidade no cenário jurisprudencial brasileiro. Uma norma constitucional ser julgada inconstitucional porque contrária ao conjunto de valores constantes de nossa Constituição.

Vale a pena acompanhar esta situação. É repleta de facetas. Permite, com o retorno do tema, recordar um dilema permanente na nossa sociedade. Salvam-se os pequenos partidos, a partir de fundamentos nobres, mas repudia-se a busca da eficiência. Esta não é valor nacional.

Fiquem os pequenos partidos nos parlamentos, na busca de se dar voz às minorias, e afasta-se a possibilidade de se conferir maior celeridade aos processos legislativos.

O tempo abaixo do Equador é insumo irrelevante. Perde-se muito tempo e assim preenche-se os espaços vazios das vidas de cada um dos nossos parlamentares.

Não há motivos de preocupação. É assim a forma de viver dos latinos, particularmente quando se instalam nos trópicos. Ainda há pouco, o ministro das Relações Exteriores da República italiana, ao cair o gabinete, proclamou de maneira grandiloqüente: "Somos um país de loucos..."

A frase do ministro D'Alema causa preocupação. Acabamos de perder a hegemonia. Temos companheiros em nossa insanidade. Até boa companhia. Repleta de criatividade, mas de baixa eficiência.

O Carnaval das cidades brasileiras, assim como das italianas, é coisa séria. O resto é o resto. Tolices de um mundo globalizado onde a eficiência aniquila a alegria de viver.

Cláudio Lembo é advogado, professor universitário, foi vice-governador do Estado de São Paulo entre 2003 e março de 2006, quando assumiu como governador.

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