terça-feira, janeiro 17, 2006

O preço da cultura...

TEREZA NOVAES
da Folha de S.Paulo
PEDRO SOARES
da Folha de S.Paulo, no Rio de Janeiro

O preço médio dos ingressos para cinema, teatro e shows subiu, em 2005, mais do que a inflação. Segundo pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a variação desses três itens básicos da cultura superou o aumento do custo de vida do consumidor medido no ano passado pela mesma instituição --que ficou em 4,93%.

Das sete capitais pesquisadas, São Paulo foi a campeã dos aumentos. A entrada dos cinemas paulistanos subiu, em média, 9,28% no ano passado, chegando a custar até R$ 19 no Cinemark do sofisticado shopping Iguatemi. Em 2004, as salas da capital haviam elevado o preço dos ingressos em um nível bem menor: 2,09%, num ano em que a inflação geral subiu com mais força.

Aumento mais forte ainda teve o tíquete médio dos shows na cidade: 27,13% em 2005. Em 2004, a alta havia sido de 9,55%. No teatro, o reajuste foi mais brando, de 5,89%, depois da disparada dos ingressos em 2004 (44,33%).

Os dados obtidos pela Folha foram extraídos da pesquisa mensal realizada pela FGV para determinar o Índice de Preços ao Consumidor (IPC), que mede a inflação ao consumidor. As variações relativas aos preços da cultura foram apuradas em São Paulo, Rio, Porto Alegre, Belo Horizonte, Recife, Brasília e Salvador. O índice oficial de inflação adotado pelo governo não é o da FGV, e sim o do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) --que foi de 5,69% no ano passado.

Para quem está do outro lado do balcão, as razões do aumento foram o crescimento da venda de ingressos de meia-entrada --que obrigaria os empresários a criar um preço "artificial" para cobrir seus custos-- e a elevação das tarifas de energia elétrica e telefone.

"Os preços aferidos não correspondem à receita do exibidor. Houve um aumento desenfreado do uso de carteiras estudantis. Há semanas de pico com 85% dos ingressos vendidos a meia-entrada. O preço do tíquete médio não aumentou", afirma Valmir Fernandes, presidente da Cinemark, a maior rede de São Paulo.

"A lei da meia-entrada inflaciona o custo do cinema para certas pessoas, favorecendo a classe estudantil e os falsificadores", diz. Para ele, não há hoje documento de estudante que tenha "fé pública". "Daqui a pouco todo mundo vai ter carteira falsa."

Casas de shows e produtores de espetáculos fazem coro sobre o assunto. "O grande motivo dos aumentos é o meio-ingresso, que cresceu nos últimos três anos", afirma Paulo Amorim, do Tom Brasil. "Temos que aceitar carteirinha de qualquer estabelecimento, até de escola de ioga."

"A quantidade de meia-entrada vem aumentando, mesmo em produções mais adultas", concorda a administradora do teatro Alfa, Beth Machado. "Em 2005, o dia em que vendemos menos meia-entrada, 45% da platéia havia usado o benefício", conta.

"Os preços vêm subindo numa tentativa de muitos produtores de descumprir a lei", afirma Gustavo Petta, presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE). Petta não nega a falsificação de documentos. Ele acredita que é preciso haver "uma regulamentação mais clara e fiscalização para combater as fraudes".

Além das queixas sobre a meia-entrada, outros fatores são apontados como responsáveis pelos aumentos de preço. O presidente da Cinemark cita as tarifas de energia elétrica, os custos de manutenção, o preço dos anúncios na mídia e o condomínio pago aos shoppings, onde está a maioria dos cinemas.

No caso das casas de shows, além das tarifas e da publicidade, os vilões seriam as passagens aéreas e os investimentos em novos equipamentos de som.

Mas a política que determina os preços dos ingressos não leva em conta apenas os custos. Outros fatores, como a capacidade de pagamento do público e a concorrência também pesam.

"Observamos como está o preço dos outros teatros do nosso porte e o tipo de público. Há alguns que "agüentam" mais, ou seja, mesmo quando há um aumento não deixam de vir", diz a administradora do Alfa. É esse o caso do Cinemark Iguatemi, voltado para um público de maior poder aquisitivo, que oferece lugares marcados e café de grife.

Para Renato Byington, da produtora D+3, que organizou o Claro que É Rock, o prestígio do artista com o público é fundamental para definir o preço do ingresso. "Não há área em que a lei da oferta e da procura funcione tão bem quanto no show business", acredita Byington. Será?

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